sexta-feira, 1 de março de 2013

velhos/as e loucos/as.


aquelas palavras que teimam em não sair na exata precisão das reflexões. e a gente se vê desarmada. especialmente quando, de tão acostumada a escrever (mais do que dizer) nossa palavra, ela se transforma no instrumento da vida contra um mundo que é campeão em (re)produzir morte.

nossa palavra, nosso empoderamento. nossa bomba nuclear contra as prisões do tempo, das regras, das exatidões de ser. mas nossos medos e anseios (e como ansiamos!) fazem de nossas palavras mortas. não conseguimos mais colocar nas frases o que nossas idades repetem aos nossos passos. e nossos corações estão ali, à beira de um colapso, entre a juventude da esperança e a velhice das obrigações, do que tem de ser feito e do que precisamos responder. estamos velhos e velhas. pior: sentimo-nos velhos e velhas.

estamos no momento de acordos. acordos com os dias, com o espelho, com as responsabilidades, com a paciência e com a falta dela. estamos com um olho no que não podemos (re)fazer e o outro no que não podemos esquecer. todo dia relembrando de onde viemos, de como aqui chegamos, pra onde queremos ir. umas concessões ali, outras coisas das quais não podemos e nem queremos arredar o pé. o tempo todo entre os limites, 'entre as agonias e alegrias de ser'.

a gente sabe que não tem as respostas. e a gente nem tem a pretensão de ter. nosso lance é estar ali, em eterna (des)feitura. queremos estar de pé, por nós, pelos que amamos, pelo mundo. a gente sabe que tem de carregar remos pesados, proporcionais à ousadia de sair do lugar que o mundo nos disse pra estar. e tem aquelas ondas das quais não se pode desviar. e nem tentamos. somos humildes. a gente sabe que erra e se enxerga capaz de mudar. e a gente nunca perdeu essa mania de se repreender. mas é exatamente onde a gente sabe que cresce, ainda guardando força nas nossas meninices, essas que transgridem nosso controle e saem pelo poros.

a gente quebra a cara. recomeça. resiste. persiste. e só sabe que só tem razão de ser porque tem outras coisas que queremos conhecer. se fôssemos crianças, seríamos a creche das caras limpas porém de narizes pintados, com todas as cores esparramadas no chão onde sentamos e partilhamos o que nos mantém vivos e vivas. a gente gosta de chão. a gente gosta da sujeira, porque o que é limpinho e asséptico não abarca nossa imaginação e nossa  falta dessa noção pré-fabricada. a gente faz tudo em casa. e é tudo feito à mão.

a gente às vezes não sabe onde tá indo, ali, naquele específico instante. e a gente bagunça. se bagunça e bagunça o resto. mas sabemos que, do nosso jeito desengonçado, as coisas acham seu lugar torto, porque nada com a gente é reto e acabado. mas a gente anda cansado... porque 'é preciso força pra sonhar e perceber que a estrada vai além do que se vê.' e já conhecemos nossa kriptônita. tantas vezes diante dela a gente se enfraquece. e tantas vezes a gente gastou da força que a gente tinha...

mas a gente vem aqui e escreve pra se empoderar. às vezes a gente vai até o bar mais central da cidade, renovar as energias. às vezes, a gente se encontra numa música. às vezes, numa lembrança. o certo é que se a gente sabe das nossas fraquezas, também conhecemos nossas baterias. sabemos pra onde ir quando a gente quer recarregar. porque a gente sabe que a vida é foda e sem querer a gente perde uns KW por aí.

a gente anda em bando. e se assanha em grupo. e sonha junto. e dá passos sós. mas sabemos que dali a pouco a gente vai tá n'algum canto onde a gente possa cantar. e se não fosse assim, nosso canto seria afinado e dolorido, porque a gente sabe, bem no fundo, que a gente só serve pra desafinar.

a gente já não dança desenfreadamente como antes. estamos descobrindo nossos limites e, de algum jeito, tentamos alargá-los. mas o melhor de tudo isso é que a gente envelhece ao mesmo tempo. e na velhice, enlouquecemos muito e juntos. a gente ainda é muito capaz de perder a condução, a pública e não de qualidade e a da razão, aquela que diz que a gente tem que acordar cedo no dia seguinte. a gente sabe que na ressaca, precisa de atenção e cuidados que dispensava antes, mas esse é o preço que se paga por ser louco e louca na nossa idade. 

tudo um bando de velho e louco. todavia, a gente sabe que dentro de nós, a gente é sol, que morre e nasce todo dia. a gente sabe que existe o dia todinho pra se reinventar. a gente não tem futuro. a gente não quer sê-lo. a gente gosta das horas. por isso que a gente as gasta. e se for com a gente, melhor.

endurecemos sem perder a ternura. e nosso ópio são nossos sonhos e tudo o que a gente aprendeu e envelheceu com eles. só eles que nunca envelhecem. nem a gente, enquanto eles viverem. 

a gente tá velho, mas a gente tem loucura suficiente pra se recusa a ser. 


Nenhum comentário: